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A noite veio.
Simplesmente veio, como um abraço.
Um abraço que já não importa.
Um abraço que não conforta.
Um abraço que não diz nada.
Mesmo que dissesse, mesmo que gritasse, ninguém o ouviria.
Muito menos eu.

Depois, as lágrimas.
Sempre as lágrimas que nada mudam.
Os olhares esguelhos que as estudam e que não incluem o meu.
Meu não é nada.
Nem os olhares, nem as lágrimas, sequer o silêncio.
Nem o silêncio posso dizer que seja meu,
porque nem esse poderia ser outra coisa, mesmo que eu assim quisesse.
Todos a olhar para o céu.
A dizerem-me coisas que nunca me disseram.
Porque tiveram vergonha ou não tiveram coragem ou simplesmente, esqueceram.
A verdade é que nada me poderia interessar menos.
A verdade, na verdade, já não me interessa nada.

Estou bem. Mesmo bem.
Podem gritar ao céu que me adoram ou odeiam,
podem bajular-me ou tentar partir-me o coração ao meio, é-me indiferente.

Está tudo bem. Mesmo bem.
A não ser que agora gostava também de poder olhar o céu mais uma vez,
só mais uma vez, um dia mais.
Tive tantos e tantos que não queria e agora queria mais um. Só mais um.
Mas na verdade, aquela verdade que já não me interessa nada, mas que na verdade ainda existe,
já não me dá o direito de saber o que quero, ao menos de me lembrar como era, quando queria.

Homens mortos, sei-o agora, não contam histórias,
mas o que dói não é o não poder contá-las, o que dói, é não me conseguir lembrar de nenhuma para contar.
E parece que nunca mais acaba.
Quando a dor é já um sentimento esquecido e o coração completamente indiferente a tudo,
um beijo toca-me a testa, a manhã chega e diz-me que tudo não passou de um sonho.
Como posso saber que é verdade e não estou a sonhar é agora?